domingo, março 5

para onde vai a televisão digital?

Muitos viram a propaganda das emissoras de TV aberta em defesa da TV gratuita. Todos sabemos que não há almoço grátis, muito menos TV, que é paga pela publicidade e por nós, que somos obrigados a ver e ouvir os reclames.

Esse anúncio, quase um teaser, demonstra a disputa política e econômica em torno dos rumos da televisão digital. Por um lado, estão os radiodifusores (com a Gloobo hegemonizando). Do outro, estão as empresas de tele comunicações (e seu forte capital). Tem um terceiro: a sociedade civil organizada. E no centro das discussões: qual é o padrão de TV digital a ser adotado no Brasil. A decisão não é técnica, é política. Como todas as decisões desse mundo.

a questão técnica, primero

É simples o que seja televisão digital. É uma tecnologia (modulação) que possibilita a compreessão digital para enviar vídeo, áudio e dados. Imagina uma brincadeira de criança. Estão lembrados daquele minhocão que a molecada passa por dentro? Nele entra sempre uma criança por vez.

Agora imagina que cada criança pese 20 quilos. Agora imagina um mágico (modulador) que chega e fala: "moleque, vc vai ficar pequeno e pesar 5 quilos! Cabum!".

Pois é... a modulação digital diminui o peso dos programas (a criança) que passam pelo canal (minhocão). E o melhor: pode fazer com que quatro programas entrem e saíam ao mesmo tempo do canal. É como quatro crianças entrassem e saíssem, uma ao lado da outra, no mesmo instante em um minhocão do mesmo tamanho. Resumo da ópera: uma emissora pode virar quatro.

o que muda então?

Essa diminuição do peso dos programas pode produzir várias transformações, depende das tecnologias que fazem isto. E aí são três tecnologias, chamadas de modelos de padrão de Tv digital. O japonês, o europeu e o americano. Parece piada, mas não é. São iguais em quase tudo: utilizam a mesma tecnologia de compressão de audio e de vídeo. O audio por exemplo vai ter o dobro de qualidade do melhor aparelho de TV atual. E os canais
Os canais vão do 7 ao 70. A tela terá quase um metro de largura. Tudo isto independente do modelo a ser adotado. A questão é que eles se diferenciam no tal do middleware, que é a modulação.

O padrão americano é ruim, já descartado.

Adotado por mais de 50 países, o europeu usa a definição padrão (imagem de DVD). E privilegia a multiprogramação. São quatro crianças passando, ao mesmo tempo e do mesmo lado, no minhocão. Claro! Na Europa há muitos países. Sempre foi difícil resolver a questão da interferência. Você morava na Alemanha, mas sofria interferência dos sinais que vinham da França, dos países do Leste, da Aústria etc. Por conta disto sempre precisou ter um número reduzido de canais. Depois da televisão digital tudo mudou por lá. Isto por que foi desenvolvido uma modulação que permite, em um mesmo canal, transmitir quatro programas ao mesmo tempo. É como hoje ligássemos no canal da TV Câmara da Alemanha e pudéssemos assistir quatro programas ao mesmo tempo: uma votação no plenário, um debate em um sala qualquer, uma inquirição na CPI e uma resolução das Comissões. Sem mudar de canal. Pois bem... Além disso, há um grande ponto forte: o padrão europeu permite a interatividade. Logo, a televisão pode ser mais um instrumento de inclusão digital no país.

Já o modelo japonês permite a chamada televisão de alta definição, que se traduz numa imagem seis vezes melhor que a de DVD. Só que isto não permite a multiprogramação. É uma criança - muito gorda - passando pelo minhocão. Além disso, possibilita a recepção móvel e portátil, que garante a televisão "gratuita" via celular. Muito bom porque você poderá assistir TV no ônibus ou no carro sem imagem com chuvisco. Não tem interatividade nenhuma. Ele só é adotado... no Japão.

vamos optar por qual?

Qualquer que seja nossa decisão, teremos que adaptar o modelo à nossa realidade. O governo brasileiro há dois anos investe em pesquisa para criar inovação através de um consórcio de 20 universidade brasileiras. Houve grandes descobertas. A maior delas: o middleware paraibano, que permite televisão de alta definição com interatividade. Ou seja, é o modelo japonês com a interatividade européia. Há outras, mas vamos voltar ao tema - da escolha política do modelo.

Há uma tendência em escolher o japonês, graças a força política das grandes emissoras de TV e rádio. Com o modelo japonês (com a inovação paraibana), tudo vai ser mantido. Ou melhor a hegemonia da Rede Globo, que também vai poder oferecer acesso a internet em banda larga, vender vídeo sob demanda e entrar no mercado da telefonia (a voIP, por exemplo). Conta a favor ser 2006 um ano eleitoral. Lula quer um cobertura do pleito menos racorosa dos mídias. O ministro Hélio Costa, que se posiciona como um lobista das emissoras, defende desde julho do ano passado o modelo japonês. Sabe que ele só vai ficar até o final deste ano na pasta. Pesa contra ele o relatório técnico da CPqD, empresa que fez um estudo dos impactos dos modelos na realidade brasileira, mostrou que o japonês vai ser o mais custoso para a população.

Sem contar que, para a sociedade civil, o modelo japonês não gera a multiprogramação. Algo fundamental para ampliação da cultura e da democracia no Brasil, embora todos saibamos que fazer televisão custa muito caro e quem paga é o anunciante - algo que mesmo os movimentos sociais defendem (vide a defesa do apoio comercial que querem as rádios comunitárias). Vamos fazer televisão, mas com verbas publicitárias, dizem. Mas o mercado públicitário não é elástico suficiente para patrocinar tudo.

Para complicar, os japoneses declararam que não cobrariam os royalties por suas tecnologias. O governo brasileiro pressiona para que eles criem uma empresa de chips no Brasil. Algo que não querem.

Para complicar mais ainda, o ministro Luiz Fernando Furlan é o mais árduo inimigo do modelo japonês. Defende o europeu. Mas defende também os interesses das teles, que não têm poder político, mas um enorme poder econômico. E com o padrão do velho continente, as teles poderiam entrar no mercado de radiodifusão. Quebraria a hegemonia da Globo, possivelmente. Como diz o presidente da Vivo, a próxima meta é superar as Havainas. Ou seja, quase todo brasileiro tem uma havaina, as teles querem bater esse número em termos de vendas de celular.

Para complicar mais e mais ainda, a sociedade civil quer multiprogramação. Nem tanto interatividade. Quer que sindicatos, movimento organizados, possam produzir e dinfundir conteúdo. É democrático. É correto. Portanto, são contra o modelo japonês.

Para complicar mais, mais e mais ainda, o Congresso resolveu discutir o tema. Mas sem decidir o modelo.

O governo quer trasmitir um jogo da seleção brasileira no dia 7 de setembro. Algo espetacular. Então seria um golaço fazer a transmissão digital este ano.

Ninguém sabe o que vai ser escolhido. Se for deixado para o ano que vem, as emissoras de TV perdem. Se for este ano, elas ganham. E se ganham, ganhará o modelo japonês com ajustes brasileiros. Logo, a propaganda no ar de defesa da televisão "gratuita" faz parte de um jogo de xadrez.








2 Comments:

At 1:07 AM, Blogger dora said...

Qual seria o grau de interatividade que o modelo japonês propiciaria? Na real, o que daria para eu fazer com a minha tv sentada na sala da minha casa?

Lívia Cunha.

 
At 12:43 PM, Blogger Fabio Malini said...

o modelo japonês é falho na interatividade. Depende das inovações brasileiras.

O europeu avançou mais nisto. Vc pode gravar um vídeo e transmiti-lo na TV. Pode participar de audiências públicas de governo: por exemplo, vão aumentar a tarifa de telefone, o governo faz sempre audiência pública, para aprovar ou não...

Vc pode votar em determinados assuntos governamentais... As opções são inúmeras...

 

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